Investigadores classificaram 35 medicamentos de consumo corrente na Suíça em categorias que vão da baixa à alta toxicidade para os ecossistemas aquáticos. Veja os resultados
Cientistas da Universidade de Lausanne (UNIL) e do Centro Universitário Unisanté classificaram 35 medicamentos de uso corrente na Suíça em função do seu impacto na biodiversidade aquática. O objetivo desta investigação é fornecer ao pessoal médico uma ferramenta para considerar os riscos ambientais associados a certos medicamentos comuns quando os prescrevem. A lista proposta está sujeita a alterações quando estiverem disponíveis novos dados, sendo a sua raridade um fator limitativo da classificação.
Todos os dias, nos países ocidentais, são consumidos milhares de medicamentos, seja para aliviar a dor, regular a tensão arterial ou tratar infecções. Mas o que acontece após a ingestão destes produtos? Evacuadas através da urina, muitas substâncias acabam nas águas residuais. Apenas parcialmente eliminadas por estes sistemas, acabam por chegar aos lagos, rios e ribeiros, constituindo um risco para os ecossistemas aquáticos. Este risco é atualmente reconhecido, mas é difícil para os médicos saberem como integrá-lo na sua prática.
Na Universidade de Lausanne (UNIL), cientistas da Faculdade de Biologia e Medicina (FBM) e da Faculdade de Geociências e Ambiente (FGSE) efectuaram uma classificação dos medicamentos de uso corrente em função da sua ecotoxicidade, ou seja, do seu perigo para o ecossistema aquático. Publicado no International Journal of Environmental Research and Public Health , o estudo revela que os medicamentos habitualmente prescritos em medicina geral – para combater inflamações ou infecções, por exemplo – têm consequências significativas para a saúde dos peixes, das algas e das bactérias essenciais à biodiversidade aquática.
Analgésicos e antibióticos entre os mais problemáticos
Os investigadores classificaram 35 medicamentos de consumo corrente na Suíça em categorias que vão da baixa à alta toxicidade para os ecossistemas aquáticos. Para isso, cruzaram três informações: os 50 medicamentos mais vendidos na Suíça (em peso), aqueles para os quais existem limiares de ecotoxicidade e a concentração dos que se encontram nos rios de Vaud e no Lago Genebra (sob a forma de princípio ativo).
Entre os medicamentos mais problemáticos contam-se analgésicos e anti-inflamatórios comuns, como o diclofenac, que é tóxico para o fígado dos peixes e pode provocar a sua morte. Existem também antibióticos, como a ciprofloxacina, que podem eliminar bactérias úteis para o equilíbrio do ecossistema e favorecer o aparecimento de bactérias resistentes aos antibióticos. O ácido mefenâmico e o paracetamol, por outro lado, estão na categoria com os menores riscos ambientais.
“Esta classificação está longe de ser completa, devido à falta de dados. Dá, no entanto, algumas primeiras indicações aos profissionais”, comenta Nathalie Chèvre, ecotoxicologista do FGSE e co-diretora do estudo. “Dos cerca de 2000 medicamentos existentes no mercado europeu, apenas classificámos 35. É um bom começo, mas é necessário estabelecer e aceitar mais limiares ecotóxicos para podermos prosseguir este tipo de análise”, acrescenta Tiphaine Charmillot, investigadora do FBM e da Unisanté, e primeira autora do artigo.
Na Suíça, estão a ser introduzidos novos tratamentos nas ETAR, com resultados promissores. “No entanto, são dispendiosos, tanto do ponto de vista económico como ecológico”, afirma Nathalie Chèvre. “Também não resolvem o problema das ligações deficientes e das descargas em tempo de chuva. Por isso, é sempre preferível lutar na fonte”.
Entretanto, os cientistas esperam que esta abordagem, que representa um primeiro passo, encoraje a integração de considerações ambientais nas escolhas terapêuticas, como já é defendido no âmbito de várias iniciativas como “medicina mais inteligente – Choosing Wisely Switzerland”. A ideia é controlar o impacto ambiental das práticas dos profissionais de saúde, oferecendo ao mesmo tempo a melhor qualidade de cuidados possível.
Na prática, isto pode significar utilizar esta classificação para dar prioridade à opção menos nociva na prescrição de medicamentos, nos casos em que dois tratamentos têm a mesma eficácia terapêutica – por exemplo, favorecer a utilização de ácido mefenâmico em vez de diclofenac para o tratamento da dor; evitar prescrições desnecessárias, como antibióticos para infecções não bacterianas (por exemplo, constipações); e, por último, propor abordagens não farmacológicas sempre que possível (tratamento da dor crónica por fisioterapia ou terapia comportamental; tratamento da depressão ligeira por fitoterapia, etc.).
“O conceito de saúde deve englobar a saúde humana, a saúde de todos os seres vivos e a saúde do ambiente natural”, explica Nicolas Senn, investigador da FBM e da Unisanté, e co-diretor do estudo. “A medicina eco-responsável também beneficia diretamente os doentes, evitando o excesso de medicação, mas também indiretamente, promovendo um ambiente mais saudável, essencial para o bem-estar”.
Classificação de medicamentos*, visão geral dos resultados:
*A palavra “medicamento” é usada aqui para se referir aos ingredientes ativos do medicamento.
Nível de risco alto a muito alto para a vida aquática e ecossistemas:
- Antibióticos (claritromicina, azitromicina, ciprofloxacino, sulfametoxazol)
- Analgésico, anti-inflamatório (diclofenaco, ibuprofeno)
- Antiepiléptico, estabilizador de humor (Carbamazepina)
- Agente de contraste iodado (ioprometo, iomeprol)
Ambiental moderado para a vida aquática e ecossistemas:
- Antibióticos (clindamicina, eritromicina, metronidazol, trimetoprima)
- Antidepressivo (venlafaxina)
- Analgésico, anti-inflamatório (cetoprofeno, ácido mefenâmico, naproxeno)
- Betabloqueador (metoprolol, propranolol, sotalol)
Risco ambiental baixo a muito baixo para a vida aquática e os ecossistemas:
- Antibióticos (ofloxacino, sulfadiazina)
- Antidepressivos (amisulprida, citalopram, mirtazapina)
- Antidiabético (metformina)
- Analgésico (paracetamol, tramadol)
- Antiepilépticos (gabapentina, lamotrigina, primidona)
- Anti-hipertensivo (candesartana, irbesartana)
- Betabloqueador (atenolol)
- Diurético (hidroclorotiazida)


