Graças à sua estabilidade atmosférica e à ausência de poluição luminosa, o deserto de Atacama é um laboratório natural único para a investigação astronómica, mas está em risco
Desde a sua inauguração em 1999, o Observatório do Paranal, construído no deserto chileno do Atacama e operado pelo Observatório Europeu do Sul (ESO), conduziu a descobertas astronómicas significativas, como a primeira imagem de um exoplaneta e a confirmação da expansão acelerada do Universo.
O Prémio Nobel da Física de 2020 atribuído a Roger Penrose, Reinhard Genzel e Andrea Ghez pela sua investigação sobre o buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea, para a qual os telescópios do Paranal foram fundamentais. O observatório é um recurso fundamental para os astrónomos de todo o mundo, incluindo os do Chile, que viu a sua comunidade astronómica crescer substancialmente nas últimas décadas.
Graças à sua estabilidade atmosférica e à ausência de poluição luminosa, o deserto de Atacama é um laboratório natural único para a investigação astronómica. Os seus céus escuros são uma herança natural que transcende as suas fronteiras e beneficia toda a humanidade. Estes atributos são essenciais para os projetos científicos que visam responder a questões fundamentais, como a origem e a evolução do Universo ou a procura de vida e a habitabilidade de outros planetas. Talvez também por este motivo, o vizinho Cerro Armazones acolha a construção do Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, o maior telescópio do mundo deste tipo – uma instalação revolucionária que irá mudar drasticamente o que sabemos sobre o nosso Universo.
Mas tudo isto está em perigo, alertam os astrónomos do ESO. “A proximidade do megaprojeto industrial da AES Andes ao Paranal representa um risco crítico para os céus noturnos mais imaculados do planeta”, salientou o Diretor-Geral do ESO, Xavier Barcons. “As emissões de poeira durante a construção, o aumento da turbulência atmosférica e, especialmente, a poluição luminosa terão um impacto irreparável nas capacidades de observação astronómica, que até agora atraíram investimentos de vários milhares de milhões de euros por parte dos governos dos Estados-Membros do ESO”.
O impacto sem precedentes de um megaprojeto
O projeto engloba um complexo industrial de mais de 3000 hectares, que se aproxima da dimensão de uma cidade, ou distrito, como Valparaíso, no Chile, ou Garching, perto de Munique, na Alemanha. Inclui a construção de um porto, de instalações de produção de amoníaco e de hidrogénio e de milhares de unidades de produção de eletricidade perto de Paranal, que ficarão localizado, se tudo correr como previsto, entre 5 e 11 quilºomteros do Observatório do Paranal”
Um apelo à proteção dos céus chilenos
“O Chile, e em particular Paranal, é um lugar verdadeiramente especial para a astronomia – os seus céus escuros são um património natural que transcende as suas fronteiras e beneficia toda a humanidade”, disse Itziar de Gregorio, Representante do ESO no Chile. “É crucial considerar localizações alternativas para este megaprojeto que não ponham em perigo um dos mais importantes tesouros astronómicos do mundo.”
A relocalização deste projeto continua a ser a única forma eficaz de evitar danos irreversíveis nos céus únicos do Paranal. Esta medida não só salvaguardará o futuro da astronomia, como também preservará um dos últimos céus escuros verdadeiramente imaculados da Terra.
