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Planeta vermelho: cientistas recolhem primeiras amostras de Marte (vídeo)

Será que houve vida em Marte? Um novo artigo documenta as primeiras 28 amostras das 43 previstas, de solo, poeira e fragmentos de rocha recolhidos pela NASA. Uma investigação que pode também ajudar a compreender a origem da Terra

Até à data, os únicos objetos de Marte que os humanos possuíam eram meteoritos que se despenharam aqui na Terra. Graças à missão Mars 2020 Perseverance Rover da NASA, os cientistas podem, pela primeira vez na história, recolher amostras selecionadas a dedo — desde núcleos rochosos do tamanho de um pedaço de giz, a colecções de rochas fragmentadas do tamanho de uma borracha de lápis, a grãos minúsculos de areia ou poeira que cabe na ponta de uma agulha.

Percy, como o rover é apelidado — veículos exploradores utilizados pela NASA para “conhecer” Marte, foi lançado do Cabo Canaveral, na Flórida, em julho de 2020, e chegou em fevereiro de 2021 à cratera Jezero ­— antigo leito de um lago com 28 milhas de largura (cerca de 45 km), selecionado pelo seu potencial para ajudar os cientistas a compreender a história do passado húmido do Planeta Vermelho. A missão, com a duração de um ano, tem como objetivo determinar se Marte alguma vez albergou vida, compreender os processos e a história do seu clima, explorar a origem e a evolução de Marte como sistema geológico e preparar a exploração humana.

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Contexto da amostragem de regolito

O regresso dos espécimes à Terra está atualmente previsto para meados ou finais da década de 2030. Entretanto, a NASA já recolheu 28 das 43 amostras previstas para a missão. “Estas vão ajudar-nos a aprender mais sobre Marte, mas também nos podem ensinar mais sobre a Terra, porque a superfície de Marte é muito mais antiga do que a superfície da Terra”, disse Libby Hausrath, professora da Faculdade de Ciências da UNLV, uma geoquímica que investiga as interações entre a água e os minerais.

É membro da equipa da NASA Mars Sample Return, entidade que ajuda a determinar quais os espécimes que o rover trará de volta à Terra para serem inspecionados por um potente equipamento de laboratório demasiado grande para ser enviado para aquele Planeta. É também a autora principal de um novo artigo de investigação publicado na revista JGR Planets da American Geophysical Union/Wiley que documenta as primeiras amostras de solo recolhidas.

“Há muitas possibilidades de tecnologias derivadas utilizadas na exploração espacial que podem depois ser utilizadas na Terra”, acrescentou Libby Hausrath. “Um dos maiores benefícios que obtemos do programa espacial é o facto de ser empolgante para estudantes e crianças, e pode ajudar a atrair pessoas para a ciência — precisamos de todos os futuros cientistas para ajudar em tópicos científicos como estes e outros.”

Este projeto concretiza um sonho de décadas da investigadora, que se apaixonou por Marte enquanto fazia o doutoramento associando-se a um orientador para escrever uma proposta de trabalho com dados dos rovers Spirit e Opportunity da NASA.

“Durante muito tempo, um dos meus objetivos profissionais foi poder participar numa missão a Marte, pelo que fiquei muito entusiasmada com esta oportunidade”, confessa, continuando: “É realmente incrível o nível de pormenor e precisão que o rover Perseverance tem. Receber os dados e conseguir apontar para uma rocha ou área de solo específica, e ser capaz de fazer medições e decifrar informações de uma pequena amostra ou partículas de poeira noutro planeta é simplesmente alucinante”.

Porque é que os cientistas se preocupam

Ao contrário da Terra, Marte não tem placas tectónicas que estejam constantemente a deslocar-se e a inclinar a superfície do planeta. Da mesma forma que os cientistas estudam os anéis de uma árvore ou examinam as estalactites de uma caverna para detetar mudanças históricas nos padrões climáticos, os investigadores podem obter informações sobre a existência de Marte com 4 mil milhões de anos, utilizando os instrumentos do rover para extrair amostras de rochas e de solo para encontrar pistas sobre a sua história, incluindo possíveis sinais de vida passada.

O exame de geoquímica das rochas e da poeira também tem o potencial de lançar luz sobre a forma como o clima de Marte aquece e arrefece e sobre a sua temperatura relativa. Esta informação pode também indicar como o planeta se formou, revelar pistas sobre o início do sistema solar e ajudar a identificar o período de tempo em que a vida surgiu na Terra.

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“Durante o início da história de Marte, acredita-se que o planeta era mais quente e tinha água líquida, o que é muito diferente do seu ambiente atual, que é muito ventoso, seco e frio”, revela a investigadora, dizendo ainda que se interessa. muito pela água e pelos tipos de ambientes que possam ser habitáveis. “E Marte, em particular, é muito semelhante à Terra. Se houve vida passada em Marte, talvez consigamos ver sinais dela”.

A missão serve também para revelar pistas sobre as semelhanças ou desafios que os humanos poderão enfrentar durante futuras viagens ao Planeta Vermelho. Para realçar a importância do reconhecimento, a investigadora contou a experiência dos primeiros astronautas na Lua. “O regolito lunar — rocha fragmentada, é realmente muito afiado e fazia buracos nos fatos espaciais dos astronautas, algo que os cientistas não tinham previsto. Há muita poeira e areia na superfície de Marte, e a recolha de amostras é de grande interesse e valor para os cientistas descobrirem como os futuros astronautas humanos poderão interagir com as partículas que rodopiam no ar ou utilizá-las como materiais de construção.

Como funciona o Rover?

O Percy possui um conjunto de instrumentos futuristas que os cientistas podem manipular a milhões de quilómetros de distância. Pode medir a química e a mineralogia disparando um laser a uma distância de vários metros. Tem instrumentos de proximidade que podem medir elementos de escala fina. Os investigadores utilizam as sua rodas para abrir trincheiras que lhes permitem ver abaixo da superfície do planeta. As câmaras de ciência, engenharia e navegação transportam as imagens para a Terra.

“Ver estas imagens de Marte de perto é como se estivéssemos num videojogo. Podemos fazer zoom, ver as rochas e o solo, escolher um local para medir, descobrir a química e a mineralogia de uma rocha específica — é simplesmente incrível que sejamos capazes de fazer estas coisas que parecem ter saído da ficção científica.”

“Há alguns instrumentos que não podem ser diminuídos e enviados para Marte. Por isso, quando as amostras estiverem de volta à Terra, teremos uma resolução muito mais clara, seremos capazes de medir quantidades mais pequenas de cada uma das amostras e com maior precisão, e analisaremos coisas como vestígios de metais e isótopos”. Até lá, as amostras estão a ser guardadas em Marte em pequenos tubos e são armazenadas no rover ou no depósito de Three Forks, uma faixa de terreno plano perto da base de um antigo delta de um rio que se formou há muito tempo quando fluiu para um lago na cratera Jezero do planeta. Os cientistas traçaram um mapa, para que possam ser encontrados mesmo que estejam enterrados sob camadas de pó.

Eventualmente, serão recuperadas por um módulo de aterragem robótico que usará um braço também robótico para recolher cuidadosamente os tubos para uma cápsula de contenção a bordo de um pequeno foguetão que os transportará para outra nave espacial para a longa viagem de regresso à Terra.

O que as rochas revelam

Na Terra, a vida encontra-se em quase todo o lado onde há água. E a equipa Percy está numa missão para descobrir se o mesmo se passava em Marte há milhares de milhões de anos, quando o clima do planeta era muito mais parecido com o nosso. As amostras de rocha e de solo estão a ser recolhidas da cratera Jezero, outrora rica em água, bem como da borda da cratera – uma faixa carregada de minerais argilosos, que resultam de interações rocha-água e têm um aspeto semelhante ao dos solos da Terra.

Até que as amostras regressem à Terra, os cientistas não poderão dizer com certeza se contêm vestígios de microrganismos que possam ter prosperado no Planeta Vermelho. Mas, até agora, há fortes indicadores que reforçam as previsões anteriores sobre a existência de água a fluir livremente em Marte há cerca de dois mil milhões de anos.

As câmaras de Percy mostram que a crosta superficial difere do solo abaixo, com seixos maiores no topo e grãos mais finos abaixo da superfície. Algumas partículas são grosseiras e desgastadas, o que prova que provavelmente tocaram em água e, portanto, são um sinal de ambientes habitáveis no passado. As medições atmosféricas fornecem sinais de processos recentes, incluindo provavelmente vapor de água na formação da crosta do solo.

O leito rochoso é abundante em olivina, um mineral também encontrado nos meteoritos de Marte. A olivina pode sofrer serpentinização – um processo que ocorre quando a olivina interage com água e o calor – o que na Terra indica o potencial de habitabilidade.

Mas talvez a descoberta mais excitante (e uma das preferidas de Hausrath) seja uma rocha com “manchas de leopardo” apelidada de “Cataratas de Cheyava”, em homenagem a uma queda de água do Grand Canyon. A rocha contém fosfato, que é de interesse para os cientistas porque é um dos principais blocos de construção da vida na Terra – desde o metabolismo energético e as membranas celulares até ao ADN e ARNr.

A análise continua. E a equipa da NASA está ansiosa por colaborar com a Agência Espacial Europeia (ESA), que planeia lançar o seu rover, o Rosalind Franklin, em 2028. Levará para Marte equipamento capaz de perfurar 200 cm abaixo da superfície – muito mais fundo do que a broca de 4-6 cm de Percy.

“Isso provavelmente permitiria ultrapassar os efeitos da radiação, pelo que poderíamos ver coisas que nunca vimos antes, como por exemplo se houvesse vestígios de moléculas orgânicas no passado em Marte”, conclui a cientista.

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