À medida que os países recorrem cada vez mais à importação de bens agrícolas, grande parte do impacto ambiental da sua produção é transferido para outras regiões do mundo. Esta “externalização” está a impulsionar a expansão agrícola em zonas ecologicamente sensíveis e pode estar a preparar terreno para uma nova vaga de perda de biodiversidade, conclui um estudo da Universidade de Princeton.
A investigação, conduzida pela Escola de Assuntos Públicos e Internacionais daquela instituição, analisou como os mercados globais de comércio influenciam a geografia da destruição de habitats e, por consequência, o futuro das espécies selvagens.
Comércio internacional: um papel ambíguo
“Sabíamos que o comércio internacional é importante porque determina onde as pessoas alteram o ambiente. Mas não tínhamos expectativas claras sobre como isso afeta as extinções – se as acelera, se as atrasa, ou ambas as coisas”, explica Alex Wiebe, doutorando em Ecologia e Biologia Evolutiva e autor principal do estudo.
Os investigadores concluíram que pelo menos 131 espécies de aves desapareceram desde 1500 devido à perda de habitat. No entanto, esse número reflete um cenário mais complexo: o comércio internacional pode abrandar as extinções em alguns países e, ao mesmo tempo, acelerá-las noutros.
Nos países desenvolvidos, as taxas de extinção atingiram o pico por volta de 1900 e têm vindo a cair desde então. Já em muitas nações em desenvolvimento, essas taxas aumentaram de forma contínua, acompanhando a expansão agrícola destinada à exportação.
“O rápido alargamento de terrenos agrícolas para culturas de exportação pode levar a extinções súbitas. Foi o que aconteceu recentemente no nordeste do Brasil, onde quatro espécies de aves desapareceram apenas nas últimas duas décadas devido à conversão de terras em áreas de cultivo”, exemplifica Wiebe.
Um modelo inovador e dados históricos
Para chegar a estas conclusões, a equipa recorreu a duas abordagens complementares:
- adaptou um modelo epidemiológico (SIR – Suscetível, Infetado, Recuperado) para simular a transformação de ecossistemas naturais em terrenos agrícolas e o eventual abandono dessas terras;
- compilou uma série temporal inédita sobre extinções de aves nos últimos cinco séculos, que permitiu comparar previsões teóricas com dados históricos.
Risco de uma nova vaga de extinções
Os autores alertam que os países que beneficiam das importações agrícolas têm também responsabilidade nas consequências ambientais associadas. Sem políticas que monitorizem a biodiversidade nos países exportadores – e sem investimentos globais em conservação – poderá ocorrer uma nova onda de extinções.
“O mais inquietante do nosso modelo é a indicação de que em breve poderemos assistir a uma subida acentuada do ritmo de extinções provocadas pela globalização”, sublinha David Wilcove, professor em Princeton e coautor do estudo. “Esse ritmo tem vindo a descer nas últimas décadas, mas à medida que mais países tropicais ricos em espécies expandem as suas exportações agrícolas e florestais, a tendência poderá inverter-se.”