#PorUmMundoMelhor

Luís Cristino

“Espelho meu, haverá alguém mais sustentável do que eu?”

Ontem, 25 de setembro, assinalamos em Portugal o Dia Nacional da Sustentabilidade. Será que celebrar é a palavra certa?

Numa primeira análise, parece que inventámos mais uma data no calendário para nos lembrarmos de algo que devia estar tatuado no nosso quotidiano. Como se precisássemos de uma desculpa anual para fingir que a sustentabilidade deveria acompanhar-nos todos os dias, em todas as nossas decisões.

Mas a verdade é desconfortável: para muitos, a sustentabilidade ainda é um departamento, um “relatório bonito”, uma certificação, uma sigla que se repete em conferências. Siglas, que muitos novos pseudo especialistas da área que teimam em confundir sustentabilidade com ESG, em tantas conferências que haverá por aí hoje. Uma espécie de green placebo que acalma consciências mas não muda realidades.

E, no entanto, a sustentabilidade não é sobre relatórios, certificações ou conferências. É sobre sobrevivência. A NOSSA!!! A das empresas. A das comunidades. A das próximas gerações. E mais: é sobre inteligência coletiva.

É preciso repetir até entrar na cabeça de todos: Que sustentabilidade não é salvar o planeta, porque o planeta não precisa de nós. Nós é que precisamos dele.
Quando falamos em sustentabilidade, não estamos a falar de árvores, rios ou oceanos que “imploram por ajuda”, nem de “abelhinhas e passarinhos”. Estamos a falar da nossa capacidade de continuar aqui, com qualidade de vida, com um sistema económico que funcione sem devorar o próprio alicerce que o sustenta. O PLANETA! 

Sustentabilidade é, no fundo, o maior teste de inteligência que a humanidade já enfrentou:
— Seremos capazes de organizar uma economia sem serrar o ramo onde estamos sentados?
— Seremos capazes de gerar riqueza sem empobrecer o futuro?
— Seremos capazes de chamar progresso àquilo que não destrói silenciosamente quem o financia: nós próprios?

Todos dizemos que queremos ser sustentáveis, mas quando chega à hora de comprar ou de pagar preferimos outros produtos, ao ponto de sermos inundados anualmente por cerca de 10 mil milhões de pacotinhos de pechinchas que nos vão sair caros à nossa saúde, por virem de países onde regras e preocupações não existem. Concluindo: ninguém compra sustentável! Apesar de todos o quererem.

Compramos mais roupa do que nunca e usamos cada vez menos. Temos o maior aterro de roupa dentro das nossas casas e não nos apercebemos, mas ficamos chocados com os montes de roupa que se acumulam no deserto do Atacama, no Chile.

Em pleno 2025, fala-se de roupa sustentável e de circularidade têxtil — essencial e um acelerador na sustentabilidade de um dos setores que já foi um dos mais importantes do nosso país — mas ainda assim não conseguimos distinguir entre roupa que pode ter uma segunda vida e desperdício têxtil. Misturamos tudo no mesmo contentor. E depois ficamos muito espantados por vermos esse mesmo desperdício em países necessitados…

Ouvi, há dias, que em Portugal já reciclamos vidro há mais de 40 anos e temos bem implementado um sistema de recolha seletiva. Contudo, ainda hoje colocamos embalagens de vidro no lixo comum. Como pode ser, MEU DEUS?!

Na realidade, continuamos a falar demais e a fazer de menos. Se somos obrigados a dedicar um Dia Nacional da Sustentabilidade é porque vivemos de forma completamente insustentável os outros 364 dias do ano.

Portugal até pode ter sido o primeiro país do mundo a instituir um “Dia da Sustentabilidade”, mas talvez a verdadeira data a assinalar seja aquela em que deixarmos de precisar deste dia. O dia em que já não seja necessário “lembrar” que a sobrevivência e a dignidade humana passam por integrar a sustentabilidade em tudo o que fazemos.

Porque a sustentabilidade não é uma agenda paralela, ou uma nova moda: é a própria essência de qualquer estratégia séria. É, aliás, a única visão empresarial que garante futuro. O resto são negócios com prazo de validade. E o resultado está à vista de todos.

Não está na hora de nivelarmos o terreno de jogo, como já ouço há muito. Está na hora de viramos tudo isto ao contrario e do o vermos dessa forma. Ou seja,em vez de pensar que a sustentabilidade é um custo, uma chatice regulatória ou uma moda ESG, pensemos nela como a mais brilhante oportunidade de soberania económica e competitividade que alguma vez tivemos.

Na verdade, sustentabilidade é o novo nome da independência.
Das nações.
Das empresas.
Das pessoas.

Quem a ignora está condenado à dependência — de matérias-primas que escasseiam, ao ponto de os chamarmos de materiais raros, de mercados que mudam de rumo, de consumidores que já não aceitam desculpas

O Dia Nacional da Sustentabilidade não devia ser só um pretexto para discursos e conferencias que inundam hoje as nossas agendas. Devia ser um espelho. Um espelho onde cada um — gestor, político, trabalhador, cidadão — se olhe e responda:
— O que é que eu, de facto, já mudei?
— Estou a ser parte da solução ou cúmplice silencioso do problema?
— Quando falo de sustentabilidade, falo de algo que pratico ou apenas de algo que exijo aos outros?

Porque no fim, a sustentabilidade é isto: não é sobre o que o planeta perde. É sobre o que nós decidimos não perder.
E hoje, 25 de Setembro, digo sem rodeios: ainda há muito trabalho a fazer. Parece que é mesmo difícil viver de forma sustentável. Mas ser sustentável já não é opção. É a nossa última oportunidade.

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