Investigadores decifram o ADN de Phaeocystis, uma microalga chave para os ecossistemas marinhos e para o clima global
Um grupo de microalgas marinhas conhecido como Phaeocystales está a atrair atenção internacional devido ao seu papel crucial nos ecossistemas oceânicos e à sua capacidade de adaptação a ambientes extremos. Encontradas em todos os oceanos, desde as frias águas da Antártida até aos trópicos, estas nanoplâncton podem viver isoladas ou em colónias. Durante as chamadas “florações”, podem formar tapetes visíveis do espaço, com impactos tanto positivos como negativos.
A equipa liderada por Andrew Allen, do J. Craig Venter Institute (JCVI) e da Scripps Institution of Oceanography, conseguiu decifrar o ADN do grupo, centrando-se principalmente na espécie Phaeocystis, oferecendo uma visão inédita da sua biologia e adaptabilidade ambiental. Compostas por até 10% da biomassa do plâncton oceânico, estas microalgas desempenham funções vitais na teia alimentar marinha, no clima e até na formação de nuvens, segundo um estudo publicado na revista Nature Communications.
Durante grandes florações, as Phaeocystis unem-se numa matriz viscosa e malcheirosa que se forma imediatamente abaixo da superfície da água. Próximo da costa, pode formar-se uma espuma que interfere com o turismo, nomeadamente na Europa Ocidental e em regiões do Mediterrâneo. As indústrias de pesca e aquacultura também enfrentam desafios, como redes e válvulas entupidas, resultando em prejuízos que podem atingir milhões de dólares por cada floração prejudicial.
Contudo, nem tudo é negativo. Graças à sua flexibilidade biológica, estas algas são essenciais em ambientes com pouca luz ou escassez de nutrientes. A sua capacidade de prosperar em diferentes temperaturas e salinidades torna-as resilientes às alterações ambientais, desempenhando um papel crítico na teia alimentar marinha.
Phaeocystis também contribui para o ciclo do carbono e do enxofre, influenciando diretamente o clima. As colónias grandes afundam rapidamente, transportando carbono da superfície para as profundezas do oceano, ajudando a regular os níveis de dióxido de carbono na atmosfera. Além disso, produzem dimetilsulfoniopropionato (DMSP), que se decompõe em dimetilsulfeto (DMS), um composto que influencia a formação de nuvens.
O estudo, intitulado “Genome-resolved biogeography of Phaeocystales, cosmopolitan bloom-forming algae”, fornece os dados genómicos mais completos até hoje sobre este grupo de algas. Foram sequenciadas 13 estirpes de Phaeocystales, incluindo genomas de referência de alta qualidade para três espécies. Estes dados revelam as inovações evolutivas que permitem a adaptação a ambientes diversos e frequentemente extremos.
Zoltán Füssy, primeiro autor do estudo, destaca que a equipa enfrentou desafios devido à alta proporção de elementos repetitivos no ADN, dificultando a montagem e anotação dos genomas. Apesar disso, conseguiram gerar recursos genómicos robustos que revelam a flexibilidade metabólica do grupo, incluindo a aquisição mixotrófica de nutrientes e adaptações à escassez de ferro e vitamina B12, especialmente em regiões polares.
O estudo também sugere transferência genética horizontal e inserções de ADN viral, evidenciando uma evolução complexa através de interações com outros organismos marinhos e vírus.
Estas descobertas reforçam a importância de integrar a diversidade das Phaeocystales em modelos globais do oceano. À medida que as alterações climáticas transformam os ecossistemas marinhos, compreender organismos como este torna-se cada vez mais essencial.
O projeto contou com a colaboração de investigadores dos EUA, República Checa, Países Baixos, França e Austrália, e foi financiado por bolsas da NOAA, NSF e da Simons Collaboration on Principles of Microbial Ecosystems (PriME).