Uma equipa de investigadores do Instituto de Geoquímica de Guangzhou (GIG) da Academia Chinesa de Ciências alertou para o risco de ocorrer, no Ártico moderno, um fenómeno semelhante ao que transformou o clima da Terra há 56 milhões de anos. O estudo, publicado na revista Nature Geoscience, revela que mudanças nas concentrações de sulfato nos oceanos funcionam como um verdadeiro “interruptor geoquímico”, capaz de alterar a forma como o metano é consumido no fundo do mar — com profundas implicações para o sistema climático global.
O papel do metano e do sulfato
O metano é o segundo gás com maior efeito de estufa, a seguir ao dióxido de carbono, e encontra-se em enormes quantidades armazenado sob o fundo marinho. Durante muito tempo, os cientistas temeram que este metano, ao libertar-se, chegasse diretamente à atmosfera e agravasse o aquecimento global.
Estudos mais recentes, no entanto, demonstram que a maior parte do metano libertado se dissolve rapidamente na água do mar e é consumido por microrganismos. Estes micróbios utilizam o sulfato como “combustível” para metabolizar o metano de forma eficiente, produzindo ao mesmo tempo subprodutos alcalinos que ajudam a contrariar a acidificação dos oceanos.
Segundo Zhang Yige, professor do GIG, este processo natural funciona como um tampão que limita os impactos do metano e da acidificação.
A lição do passado: o Máximo Térmico do Paleoceno-Eoceno
Contudo, há cerca de 56 milhões de anos, durante o chamado Máximo Térmico do Paleoceno-Eoceno, as águas do Ártico tinham concentrações de sulfato inferiores a um terço das atuais.
Com o sulfato em falta, o metano difundiu-se para a coluna de água, onde foi rapidamente consumido por bactérias aeróbias. Este “flash” de oxidação gerou grandes quantidades de dióxido de carbono, que se acumularam nas águas do Ártico em níveis muito superiores aos do resto do planeta.
Na prática, o oceano deixou de funcionar como uma “esponja” que absorvia dióxido de carbono e passou a atuar como uma “chaminé”, libertando-o em larga escala para a atmosfera e amplificando o aquecimento global.
Implicações para o futuro do Ártico
Os investigadores alertam que algo semelhante poderá repetir-se, uma vez que o Oceano Ártico moderno está a aquecer e a tornar-se mais fresco a um ritmo acelerado, devido ao degelo e ao impacto das alterações climáticas.
Esse processo pode vir a perturbar profundamente o ciclo do carbono no Ártico e, por consequência, o equilíbrio climático global.
O estudo reforça a importância de compreender os mecanismos geoquímicos que controlam a libertação e o consumo de metano no fundo do mar, sublinhando que o passado da Terra pode ser um aviso claro para o futuro próximo.