Um novo estudo científico revela que, entre 1600 e 600 a.C., a Núbia manteve um papel central e duradouro no comércio de marfim, garantindo o abastecimento contínuo do Levante meridional. A investigação demonstra que este fluxo não foi apenas uma consequência da hegemonia egípcia, mas o resultado de uma rede de comércio autónoma e sustentável controlada por agentes núbios ao longo de um milénio.

Vários artefatos de marfim. Detalhes no estudo original. Crédito: Shochat et al. 2025
Marfim: símbolo de prestígio e poder
No mundo antigo, o marfim era muito mais do que um material exótico. Objetos como punhos de adagas, caixas cosméticas, pentes ou incrustações em mobiliário serviam como símbolos de autoridade, riqueza e ligação a redes de troca internacionais. Exibidos em contextos palacianos, templários e domésticos, estes artefactos reforçavam a posição das elites e a sua participação em circuitos de prestígio que se estendiam por todo o Mediterrâneo oriental e pelo Crescente Fértil.
As provas científicas
Os investigadores recorreram a análises proteómicas e isotópicas para determinar a origem biológica e geográfica do marfim. Os resultados revelam que a esmagadora maioria dos objetos foi produzida a partir de presas de elefante africano, provenientes de habitats em mosaico de savana e floresta na bacia do Nilo Branco, no coração da África subsariana.
Curiosamente, apesar das transformações políticas — desde o domínio egípcio sobre as cidades-estado cananeias na Idade do Bronze até ao surgimento dos reinos de Israel e Judá na Idade do Ferro — a origem do marfim manteve-se constante. Isso sugere que os comerciantes núbios asseguraram o controlo da cadeia de abastecimento, muitas vezes de forma independente do Egito.
Comércio resiliente em tempos de crise
A persistência deste comércio durante séculos de instabilidade, incluindo o colapso das sociedades urbanas do final da Idade do Bronze e a retirada egípcia do Levante, mostra que a rede núbia conseguiu resistir às convulsões políticas. O marfim continuou a chegar às cidades costeiras filisteias e fenícias, bem como às capitais israelitas e judaítas, onde era usado sobretudo em mobiliário decorativo. Mais tarde, estas peças foram alvo de cobiça dos impérios assírio e babilónico, figurando como despojos de guerra ou tributo.

Mapa do Levante Meridional com os principais sítios e regiões geográficas mencionados no texto.
Um monopólio africano
O estudo reforça a ideia de que a Núbia desempenhou um papel ativo e central no comércio inter-regional, funcionando como elo de ligação entre os caçadores locais de elefantes em África e os consumidores das luxuosas cortes do Levante. Ao longo de mil anos, os núbios não só abasteceram a região com marfim africano, como garantiram a continuidade de uma rota comercial fundamental, mesmo quando grandes impérios como o Egito perderam o controlo da região.
Este artigo foi escrito com base neste estudo