O estudo Atleta Feliz da Federação Francesa de Equitação procurou identificar os sinais de bem-estar animal em equídeos de alta competição. Será que os humanos conseguem decifrar as emoções destes magníficos animais?
O trabalho inicial da tese “Atleta Feliz” começou em 2022, a pedido da Fédération Française d`Equitation (FFE), para identificar indicadores de emoções positivas em cavalos de competição, bem como avaliar a capacidade do público percecionar as suas emoções.
A primeira parte do estudo analisou o comportamento dos cavalos de desporto no estábulo, ou seja, no seu estilo de vida habitual. O estudo evidenciou o fato de os cavalos que vivem em condições de bem-estar, onde são cumpridos “os famosos 3FS: forragem de forma contínua; amigos, portanto contacto social com outros cavalos e liberdade, isto é oportunidade de se movimentarem livremente”, eram mais saudáveis e mais “felizes”.
Embora os benefícios da 3Fs já tenham sido demonstrados em várias ocasiões, este estudo realizado nos estábulos dos cavaleiros da equipa francesa, é inédito no desporto de alta competição. Os desempenhos dos cavalos franceses, medalhados nos últimos Jogos Olímpicos, demonstram que um estilo de vida que respeita os 3Fs é totalmente compatível com o desporto de alto nível e que os cavalos têm um desempenho tão bom como os outros.
Observações que desfazem certas ideias preconcebidas:
– O acesso a forragem ilimitada não leva ao excesso de peso nos cavalos de desporto,
– Quanto mais liberdade os cavalos têm, menos lesões sofrem, além disso evitam os efeitos nefastos de um estilo de vida sedentário. Também foi verificado que tinham menos alopecia —zona do corpo sem pelo.
– Os cavalos que vivem em grupo, em contato direto com os seus congéneres, também não sofrem lesões adicionais e desenvolvem menos comportamentos anormais. As interações observadas foram interação visual, olfativa, tátil e total (para os cavalos que vivem em pasto).
Protocolos de ponta para identificar “atletas felizes”
O estudo científico do comportamento das espécies animais, está a ser realizado em todo o mundo. Vários destes estudos baseiam-se na análise das expressões faciais dos animais para determinar as mímicas que indicam um estado de conforto e bem-estar emocional. Por exemplo, foram estudadas as expressões faciais de cães, ratos e cavalos, o que permite compreender melhor as emoções positivas dos animais.
“Analisar as expressões faciais em cavalos é algo realmente novo. Consideramos estes indicadores muito promissores e complementares ao estudo do seu comportamento. Isto permitir-nos-á compreender melhor as emoções de um cavalo”, explica Léa Lansade, diretora de investigação em etologia no INRAE e diretora da tese “Happy Athlete”.
Conseguimos reconhecer as expressões faciais de um cavalo?
Para começar, a equipa de investigação realizou uma experiência online para testar o conhecimento do público sobre as expressões faciais dos cavalos O site un-cheval-une-emotion.fr recolheu respostas de mais de 800 participantes, aos quais foi pedido que utilizassem fotografias para tentar determinar se a expressão do cavalo indicava uma emoção negativa ou positiva e se era de baixa ou de alta intensidade.
Os resultados mostraram que os humanos são bastante bons a ler emoções positivas de baixa intensidade (por exemplo, um cavalo a descansar ao sol), mas fracos a ler emoções positivas de alta intensidade (por exemplo, a excitação ligada à antecipação de chegada de alimento). Por outro lado, observou-se que as emoções negativas de baixa intensidade (desconforto) são menos bem identificadas do que as negativas de alta intensidade (medo).
Além disso, foi observado que as pessoas que interagem regularmente com cavalos (cavaleiros, pessoa em contato com o cavalo pelo menos uma vez por semana, ou a trabalhar no mundo dos cavalos, e até quem possuiu pelo menos um cavalo) não foram melhores a identificar as expressões faciais destes animais comparativamente com os outros inquiridos.
Esta experiência mostra que a maioria do público é capaz de identificar um cavalo que apresenta uma emoção negativa forte, mas é incapaz de reconhecer um cavalo que apresenta uma emoção positiva de grande intensidade Esta observação abre a porta à ideia de treinar melhor os cavaleiros para reconhecerem as emoções destes animais.
Os próximos passos
Durante os próximos meses, Romane Phelipon estudará as expressões faciais dos cavalos utilizando um protocolo para analisar a antecipação positiva (por exemplo, comida) e a antecipação negativa (por exemplo, isolamento). Estudará as expressões faciais, combinadas com uma medição de cortisol, a hormona do stress, para confirmar o estado emocional dos cavalos que participam no teste. Isto deverá permitir criar expressões faciais de cavalos nestes diferentes contextos.
O próximo passo será determinar se estes perfis de expressão facial podem ser encontrados no contexto de antecipação positiva no cavalo, por exemplo à entrada de uma arena de competição. O facto de o cavalo estar num contexto de antecipação positiva à entrada de uma pista de competição, por exemplo, significa que estamos perante um “Atleta Feliz”, motivado para entrar, ou se, pelo contrário, o perfil das expressões está mais ligado à antecipação negativa. Estes perfis poderiam então ser correlacionados com o desempenho desportivo dos cavalos.
NOTA
Esta é uma nova atualização da tese “Happy Athlete”, realizada desde 2022 por Romane Phélipon, doutoranda em etologia, graças ao financiamento do fundo de dotação da Fédération Française d’Équitation EquiAction, em parceria com o Institut français du cheval et de l’équitation (IFCE) e o Instituto Nacional de Investigação para a Agricultura, a Alimentação e o Ambiente (INRAE). Estes resultados foram publicados na revista científica Frontiers in Veterinary Science em 2024.
Pode ler mais aqui
