Na passada segunda feira, segunda feira de Páscoa, um dia que se deveria celebrar a Vida, amanheceu com o peso da morte. Deveria ser um dia de Luz, mas foi um dia escuro.
Partiu o Papa Francisco.
E com ele, silencia-se uma das vozes mais lúcidas, humanas e corajosas dos nossos tempos. Aliás, ouso desde já dizer que Francisco não foi apenas um líder espiritual. Foi, talvez, o último grande líder moral do nosso tempo.
Não é preciso ser crente para reconhecer a grandeza deste homem. Que fez da empatia a sua força, da dignidade a sua bandeira e do cuidado o seu legado.
Bastava ouvi-lo. Bastava sentir que não havia ali filtro, nem cálculo. Havia Verdade.
Na forma como chamava a atenção para o sofrimento dos mais frágeis.
Na forma como gritou, ao mundo inteiro, que não há justiça social sem justiça ambiental.
Que cuidar da Terra é cuidar de nós.
E que a fé — qualquer fé — só faz sentido se for vivida com amor. Com empatia. Com ação.
Com a Laudato Si’, em 2015, ergueu uma ponte entre espiritualidade e ecologia, entre o sagrado e o comum.
Fez aquilo que muitos líderes não ousaram fazer: disse, alto, claro e em bom som, que o modelo económico atual está a falhar. Que a cultura do usar e deitar fora mata. Que a indiferença é pecado.
E deixou-nos um mapa. Um guião de consciência. Um convite à responsabilidade.
Em 2019, através do programa ‘Economia do Francisco’, ele enfatizava a importância da justiça económica e do bem comum, alinhando-se com a crescente procura de modelos de negócio orientados por objetivos. Tal como se espera que as empresas tenham um objetivo para além do lucro, o Papa Francisco defendia uma economia que sirva o bem-estar de todos, particularmente dos marginalizados.
Não deixar ninguém para trás! (onde já ouvimos isto?!)
Mesmo assim, e não se resignando, em 2023, com a Laudate Deum, “gritou” que não há mais tempo a perder. Que as alterações climáticas, a pobreza, a exclusão, a guerra e a degradação do planeta são parte da mesma ferida.
O seu exemplo atravessou fronteiras, credos e ideologias. Inspirou milhões — crentes e não crentes — porque nunca falou de cima. Falou ao lado. Como quem caminha connosco. Ele falava com o coração, e não se escondia atrás de discursos calculistas. E o mundo ouvia-o. Crentes e não crentes. Ateus e agnósticos. Jovens e velhos. Todos, todos, todos!
Francisco foi, para mim, o líder que qualquer empresa gostaria de ter. Escrevi-o após as Jornadas Mundiais da Juventude: o seu carisma não vinha do poder, mas pela coragem. Pela compaixão. Pela lucidez num tempo de cinismo e aparência. Da sua coragem em nomear o indizível. Da sua visão sistémica — de que tudo está ligado: clima, justiça, espiritualidade, economia, ética, consumo, pobreza.
Hoje, mantenho: o mundo empresarial tem muito a aprender com o seu legado.
E agora?
Agora que o homem partiu, resta-nos o compromisso.
De cuidar da casa comum.
De não deixar cair o fio do pensamento que ele teceu.
De sermos terra fértil para a semente que ele nos deixou.
Porque o seu legado não é apenas uma herança. É uma convocatória. Para todos, todos, todos.
Sem exceções.
Sem fronteiras.
Com humanidade.
Obrigado, Papa Francisco.
Pelo Amor com letra grande.
Pela coragem de dizer não à indiferença.
Por nos mostrar que natureza e humanidade são inseparáveis. E que cuidar de uma é respeitar a outra.
E acima de tudo por nos lembrar, que até ao fim, que não há salvação individual.
Que o seu legado nos inspire a continuar a trabalhar por um futuro mais justo e sustentável para todos. Que tenhamos um propósito!
E que neste primeiro Dia da Terra sem a sua presença entre nós, saibamos manter acessa a luz que ele acendeu. Que recordemos que as verdadeiras lideranças, como as do Papa Francisco, não desaparecem – transformam-se em consciência coletiva.
Porque tudo o que nos deixou não pode ter sido em vão.


