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Teresa Cotrim

Já ouviu falar em ética ambiental? (com vídeo)

Pedro Bingre do Amaral, professor do Instituto Politécnico de Coimbra e Presidente da Liga para a Protecção da Natureza, explica como esta nasceu e como o conceito evoluiu. Porém, questione-se: será que devemos ter compaixão para com seres não humanos? E se não tivermos aguentará o planeta tanta pressão?

É um tema muito interessante em termos históricos, porque é uma disciplina filosófica criada apenas no século XX. Ao longo da história da humanidade, “não passava pela cabeça de nenhum filósofo ter consideração ética com uma criatura não humana”, explica  Pedro Bingre do Amaral, professor do Instituto Politécnico de Coimbra e Presidente da Liga para a Protecção da Natureza, continuando “quando pensadores religiosos, ou homens religiosos como Jesus no Ocidente e Buda no Oriente propuseram uma ética universalista, dizendo que somos todos iguais e todos merecedores de compaixão,violaram e escandalizaram os seus tempos com aquela ideia de dizer que todos somos eticamente dignos”.

Portanto, nenhum filósofo da Antiguidade, no Ocidente, partia do princípio que um escravo, um bárbaro, ou uma mulher, pudesse ter, merecer tanta consideração ética, tanto cuidado, como um nobre. Isto não passava pela cabeça de ninguém. E ao longo da história da humanidade houve um progresso religioso e filosófico muito lento para chegarmos à Declaração Universal dos Direitos Humanos a dizer que todo ser humano, independentemente de ser rico ou pobre, ser órfão, filhos de pais desconhecidos ou nobre, merece igual consideração e igual estima. Mas esta consideração ética nunca se estendeu fora dos seres humanos. Era só uma consideração ética interpares.

Foi só em 1948 que um filósofo norte-americano e professor de engenharia florestal chamado Aldo Leopoldo propôs a chamada ética da Terra. “Dizia que nós, seres humanos, temos a obrigação de ter em consideração ética criaturas não humanas. Mas essa criatura não humana que o Aldo Leopoldo propunha eram os ecossistemas. Nós temos de respeitar a integridade dos ecossistemas, tal como respeitamos nós seres humanos a integridade uns dos outros”, explica.

Mas Aldo Leopoldo defendia a integridade ética do ecossistema, o que não significa que este não possa ser utilizado na agricultura ou na floresta. Aldo Leopoldo não se opunha nem à zootecnia, nem à caça, nem à silvicultura, nem à agricultura. O que defendia é que todas essas práticas devem ser feitas de uma forma que não leve o ecossistema ao colapso nem a espécie à extinção. “Hoje pensamos que esta ética é banal porque ouvimos falar há tanto tempo, esta geração mais nova ouve falar disto a toda hora, mas no seu tempo isto foi escandaloso”, destaca Pedro Bingre do Amaral, explicando “porque é fácil retrocedermos ao pensamento anterior e pensarmos: mas, porque devo ter consideração para com os ecossistemas? Se me perder na floresta, os predadores vão implacavelmente comer-me e a floresta não me vai alimentar. Se esta não me trata com compaixão, porque a devo tratar com compaixão? Porque devo amar o lobo se este caso tenha oportunidade me come vivo? Portanto, este pensamento ético é muito subtil, é muito precário, é muito recente e tem implicações muito subtis”.

Esta ética ambiental, que incidentalmente é a ética que esteve subjacente à formação da Liga para a Proteção da Natureza em 1948, é a ética que anima esta mesma Liga para a Proteção da Natureza; uma criação, essencialmente, académica da silvicultura e da agronomia, e mais tarde da biologia. “Em termos éticos, temos assistido a uma evolução muito curiosa, porque esta ética ambiental de primeira geração do Aldo Leopold, foi basicamente a representada pela Liga para a Proteção da Natureza, que durante muitas décadas não só foi a primeira, mas como foi a única organização ambientalista da Península Ibérica, fundada em 1948, tanto em Portugal como em Espanha, todas as outras organizações que surgiram, surgiram a partir da década de 70”.

Pedro Bingre do Amaral explica que quando surgiram a partir da década de 70, já foi inspirada numa outra pensadora chamada Rachel Carson, que estava preocupada com o efeito de poluentes como o DDT, caso dos pesticidas e mais tarde outros pensadores preocupados com a energia nuclear. É um outro tipo de ativismo ambiental, preocupado com questões, já não tanto com os ecossistemas e a biodiversidade, como uma liga para a proteção da natureza, mas questões como a poluição física e química, como a questão dos resíduos. E é também um ativismo ambiental que tem uma estética diferente, se quisermos. Tem uma estética muito mais mediática, muito mais ligada às grandes causas, ao grande apelo à opinião pública. “A Liga para a Proteção da Natureza tenta fazer o seu magistério cultivando as suas próprias propriedades, somos proprietários de cerca de 2 mil hectares, e criando projetos que dêem um exemplo”. O presidente da Liga para a Proteção da Natureza, garante: “Acreditamos que a ética predica-se, antes de mais, pelo exemplo e mais pelo exemplo do que pela palavra. Embora também façamos uso da palavra naturalmente, que é o que eu estou a fazer agora”. Mais recentemente há uma terceira onda de ética que não é propriamente ambiental, é a onda, a ética animalista, inspirada num filósofo anglo-saxónico chamado Peter Singer, que defende que sim, o ser humano tem deveres éticos para com criaturas não humanas, mas não para com os ecossistemas, nem sequer para com as espécies. “O ser humano tem deveres éticos para com todas as criaturas dotadas de sentimento. E, portanto, o que importa é assegurar que todo e qualquer animal seja poupado de sofrimento, seja ele exótico ou nativo, autóctono ou holóctono, uma praga invasora ou uma espécie em via de extinção, é indiferente”, explica, afirmando ainda que “é essa ética animalista, que neste momento, por exemplo, tem grande protagonismo na discussão pública, é aquela que é responsável, por exemplo, pela defesa do bem-estar animal, bem-estar animal na zootecnia, nos animais domésticos e tudo mais”.

E, no limite, essa defesa do bem-estar animal e do tratamento ético de igual para igual com todo o animal ser vivo, é responsável por opções políticas como utilizar o dinheiro público para criar hospitais para animais, proibir, por exemplo, a caça, proibir o controle de espécies de animais invasores e tudo mais, sob o pretexto de que não se vai matar uma espécie só por ela ser exótica num dado ecossistema e fazê-la sofrer.

Espécies animais, bem entendidos, porque nesta ética dita animalista, as plantas, que são a parte fundamental dos ecossistemas, estão ausentes, porque as plantas são destituídas de sentimentos e as plantas se tiverem algum valor, é valor instrumental apenas para manter esses mesmos animais e mais nada.

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