O Japão decidiu investir fortemente na fotossíntese artificial, uma tecnologia ainda em fase inicial mas com grande potencial, que pretende transformar dióxido de carbono, água e luz solar em combustível para a aviação e matérias-primas para a indústria química.
Por Vivaldo José Breternitz (*)
Trata-se de um projeto que alia ambição científica e estratégia política. Num país com escassez de recursos naturais, a proposta passa por procurar autonomia energética, convertendo o principal símbolo da crise climática – o CO₂ – numa fonte de recursos para a economia do futuro, através de um processo que imita a fotossíntese.

O governo japonês anunciou um plano para atingir a utilização desta tecnologia em escala industrial até 2040, tornando-a peça fundamental nos esforços para alcançar a neutralidade carbónica até 2050.
Para o Japão, a possibilidade de produzir combustível para aviação e outros produtos para a indústria química a partir do CO₂ capturado representa não apenas uma redução da dependência externa, mas também a criação de novas cadeias produtivas de elevado valor tecnológico. Mais do que uma política ambiental, trata-se de uma aposta na competitividade internacional, com foco em áreas onde o país já possui competências consolidadas, como química avançada, materiais e fotónica.
No campo da investigação, o Japão parte de uma posição bastante forte. Universidades e centros de inovação têm registado avanços significativos, como a criação de novos fotocatalisadores – materiais que, quando expostos à luz, são capazes de acelerar reações químicas sem se consumirem no processo – e hidrogéis, materiais que conseguem absorver e reter grandes quantidades de água ou outros fluidos na sua estrutura sem se dissolverem. Estes materiais são capazes de facilitar a conversão da luz solar nos combustíveis e produtos químicos desejados.
Do ponto de vista financeiro, a iniciativa conta com o apoio da NEDO (New Energy and Industrial Technology Development Organization), um organismo estatal dedicado à investigação e desenvolvimento que, desde 1978, apoia trabalhos nas áreas das energias renováveis e tecnologias emergentes.
As aplicações mais promissoras estão em setores difíceis de descarbonizar. A aviação, por exemplo, exige combustíveis de elevada densidade energética e não há perspetivas de eletrificação no horizonte. A indústria química de base também poderá beneficiar de matérias-primas sintetizadas a partir do CO₂ em vez de derivados do petróleo, abrindo caminho para a neutralidade carbónica.
Ainda assim, os desafios são grandes. A eficiência dos processos continua baixa e a produção em escala industrial está longe de ser uma realidade. Em Tóquio, há consciência de que alcançar os resultados desejados exigirá não apenas inovação científica, mas também um ambiente político e económico favorável.
Especialistas alertam que os primeiros produtos deverão ser mais caros do que os derivados de petróleo, o que implicará incentivos, créditos de carbono, obrigatoriedade de mistura nos combustíveis e certificações que comprovem o impacto ambiental positivo ao longo do ciclo de vida dos novos produtos.
Sem apoio político consistente, o risco é a nova tecnologia permanecer confinada aos laboratórios. Mas, se o plano resultar, o Japão poderá posicionar-se como líder num setor emergente, capaz não só de reduzir as suas emissões, mas também de exportar tecnologia e conhecimento para o mundo.
(*) Vivaldo José Breternitz, Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor, consultor e diretor do Fórum Brasileiro de Internet das Coisas, In Ecodebate.