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ONG Ibéricas unem-se contra o gasoduto H2Med

Várias organizações manifestam as suas preocupações relativamente ao gasoduto
H2Med e ao uso ineficiente do hidrogénio verde

As organizações ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável e a rede Gas No es Solución, juntamente com os signatários listados abaixo, vêm manifestar as suas graves preocupações relativamente ao projeto H2Med, o mais relevante projeto de exportação de hidrogénio, por gasoduto, da Península Ibérica para a Europa Central. As organizações publicam um posicionamento com os argumentos contra o projeto, após o encerramento, ontem, dia 18 de dezembro, do “Convite à manifestação de interesse” para os potenciais produtores e consumidores de hidrogénio envolvidos neste projeto.
Em plena crise climática, o hidrogénio verde tem sido cada vez mais promovido como uma solução milagrosa para a transição energética em vários setores e como um elemento-chave para alcançar a neutralidade climática. A União Europeia (UE) definiu o hidrogénio verde como uma prioridade nas suas estratégias e planos de investimento, prevendo um consumo de 20 milhões de toneladas de hidrogénio verde até 2030. Como resultado, têm surgido numerosos projetos e iniciativas relacionadas com hidrogénio verde, que contemplam a exportação de quantidades substanciais deste recurso, como é o caso do projeto H2Med. No entanto, continuam a existir preocupações sobre se estas iniciativas estão a ter em conta os potenciais inconvenientes, ou se houve uma comparação com alternativas mais sustentáveis.

Os custos escondidos do H2Med

O projeto do gasoduto H2Med tem como objetivo transportar hidrogénio verde de Portugal, passando por Espanha, pelo Mar Mediterrâneo, até França e, por fim, à Alemanha. Este projeto inclui a construção de duas secções principais: CelZa e BarMar. A secção CelZa liga Celorico da Beira, em Portugal, a Zamora, em Espanha. Esta extensão cobre 162 km em território português, terá uma capacidade de 750 kton de hidrogénio verde por ano e está orçamentada em 350 milhões de euros. A produção deste volume de hidrogénio verde exigirá cerca de 6-7 GW de capacidade de eletrólise, superando os 3 GW estabelecidos como meta no Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) de Portugal. Além disso, será necessária a instalação de 14-17 GW de nova capacidade de energia renovável, o dobro da capacidade renovável instalada em Portugal em 2023. A secção BarMar corresponde ao segmento submarino do gasoduto, ligando Barcelona, em Espanha, a Marselha, em França. Este trecho terá uma extensão de
455 km sob o Mar Mediterrâneo e está projetado para custar 2,5 mil milhões de euros.

Gota de água com uma árvores lá dentro. Foto gerada por IA
Foto: Freepik

No total, o H2Med terá uma capacidade de transporte de até 2 milhões de toneladas de hidrogénio por ano até 2030. Com estes objetivos, a Península Ibérica contribuiria com 10% das metas da União Europeia ou 20% das metas de produção interna. Para tal, seria necessária a instalação de, pelo menos, 40 GW de nova capacidade de energia renovável em Portugal e Espanha, o que geraria competição por terrenos, recursos de energia renovável e infraestruturas de transporte de eletricidade, podendo comprometer a disponibilidade de energia renovável para consumo interno. Este aumento substancial da capacidade renovável pode ter impactos significativos nos ecossistemas, com potenciais perturbações nos habitats e ameaças à biodiversidade.
Caso o gasoduto seja concluído, mas a disponibilidade de hidrogénio verde seja insuficiente, a solução de recurso será a mistura com gás fóssil. Esta abordagem pode prolongar a dependência do gás fóssil por décadas, aumentar a dependência energética de países estrangeiros e continuar a ser uma fonte significativa de emissões de gases com efeito de estufa (GEE).

Quanto hidrogénio precisa a Europa Central?


Até ao momento, não existem dados fiáveis sobre a procura futura exata de hidrogénio verde na Europa Central. O próprio Tribunal de Contas Europeu questionou a base técnica dos objetivos europeus, denunciando que “a Comissão não realizou análises rigorosas antes de definir as metas de produção e importação de hidrogénio verde da UE”3, num total de 20 milhões de toneladas até 2030. Este crescente entusiasmo careceu de uma análise e debate aprofundados sobre os prós e contras do hidrogénio verde, bem como de uma avaliação crítica do seu papel em comparação com outras opções de transição. Além disso, alguns estudos sugerem que, ao priorizar a eletrificação, a procura de hidrogénio poderia ser reduzida para até um quinto dos níveis projetados no plano REPowerEU4.

Sem dados de procura exatos a nível europeu, nem a perspetiva de produção de hidrogénio verde para exportação, o gasoduto pode revelar-se um desperdício de fundos públicos. Acresce que o transporte de hidrogénio é tecnicamente desafiante e consome quantidades significativas de energia. Por isso, priorizar a produção e consumo local de hidrogénio verde é mais eficiente, reservando-o para setores de difícil eletrificação acompanhado de medidas de redução da procura (por exemplo, produção de aço, amoníaco, aviação e transporte marítimo).

Apesar destas limitações e riscos, o Memorando de Entendimento para o ambicioso projeto H2Med foi assinado pelos seus promotores — REN (Portugal), Enagás (Espanha) e Téréga & GRTgaz (França) — em dezembro de 2022. Em novembro de 2023, o projeto alcançou um marco importante ao ser oficialmente adotado pela Comissão Europeia como um Projeto de Interesse Comum e Mútuo (PCI/PMI). Esta designação confere ao projeto vantagens estratégicas, procedimentos de licenciamento acelerados e acesso a financiamento, incluindo fundos públicos como o Mecanismo Interligar a Europa (CEF). Em Espanha, foi integrado no PNEC como uma infraestrutura que permitirá ao país tornar-se o principal hub mundial de hidrogénio renovável.


Por todas estas razões, os signatários desta posição coincidem numa avaliação negativa sobre o momento atual para o desenvolvimento de grandes infraestruturas de transporte e exportação de hidrogénio, como o H2Med. Em vez disso, os fundos públicos destinados ao H2Med poderiam ser melhor utilizados em alternativas comprovadas, como a eletrificação direta, o autoconsumo, as comunidades de energia e a melhoria da eficiência energética.

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