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Ossos fossilizados do ouvido provam que os peixes do rio vieram do mar

Novo estudo revela que peixes marinhos invadiram rios e lagos em várias ocasiões, desenvolvendo audição mais apurada ao longo do processo.

Uma descoberta paleontológica acaba de alterar a forma como entendemos a evolução dos peixes de água doce. Uma equipa liderada pela paleontóloga Juan Liu, da Universidade da Califórnia em Berkeley, analisou fósseis com estruturas auditivas preservadas e concluiu que os antepassados de milhares de espécies de peixes de rio não surgiram apenas de uma invasão única de água doce, mas de múltiplas incursões a partir do oceano.

O estudo, publicado na revista Science, descreve o fóssil de um pequeno peixe com 67 milhões de anos, Acronichthys maccagnoi, encontrado no Canadá, que preserva um sistema auditivo conhecido como aparelho de Weber. Esta estrutura, formada por ossículos que ligam a bexiga natatória ao ouvido interno, confere aos peixes uma capacidade de ouvir frequências muito mais elevadas do que os peixes marinhos comuns.

Hoje, cerca de dois terços dos peixes de água doce — incluindo carpas, tetras, peixes-gato e até o popular peixe-zebra usado em investigação científica — possuem este sofisticado sistema auditivo. A descoberta mostra que a sua origem foi marinha, e não exclusivamente de água doce, como se acreditava até agora.

Uma audição refinada vinda do mar

Segundo Liu, a investigação indica que os precursores do aparelho de Weber começaram a desenvolver-se ainda em ambiente marinho, há cerca de 154 milhões de anos, durante o Jurássico tardio, coincidindo com a fragmentação do supercontinente Pangeia. Mais tarde, em pelo menos duas ocasiões distintas, linhagens desses peixes migraram para rios e lagos, onde aperfeiçoaram a sua audição.

“Pensava-se que os otófisos — o grupo que inclui estes peixes com ouvido especializado — tinham tido uma origem única em água doce. Mas os fósseis e as análises genómicas mostram que a história foi bem diferente: um ancestral marinho, seguido de múltiplas incursões em ambientes de água doce”, explica Liu.

Este processo, acrescenta a investigadora, terá sido determinante para a impressionante diversidade deste grupo, que hoje representa a mais bem-sucedida linhagem de peixes de água doce no planeta.

Um ouvido aquático engenhoso

Enquanto os mamíferos desenvolveram ossículos no ouvido médio para transmitir as vibrações do ar, os peixes enfrentam um desafio diferente: as ondas sonoras propagam-se facilmente através do seu corpo, quase sem diferença em relação à água circundante. O aparelho de Weber resolve o problema ligando a bexiga natatória — que funciona como uma câmara de ressonância — ao ouvido interno, permitindo detetar sons até 15 mil Hertz, um valor próximo da audição humana.

O fóssil agora estudado mostra que, mesmo há dezenas de milhões de anos, estes peixes já possuíam uma audição muito mais sensível do que os restantes peixes marinhos.

Diversidade impulsionada por novas conquistas

Para os investigadores, este é um exemplo claro de como a entrada repetida em novos habitats, combinada com inovações anatómicas, pode impulsionar grandes explosões de diversidade evolutiva.

“Durante muito tempo assumimos que os otófisos tinham origem em rios e lagos, porque a grande maioria vive nesses ambientes. Mas agora percebemos que a sua história começou no mar, e que a diversidade atual resulta de várias colonizações de água doce. Faz muito mais sentido”, comenta Michael Newbrey, coautor do estudo e ictiólogo da Columbus State University.

O fóssil de Acronichthys maccagnoi, escavado na província de Alberta ao longo de seis temporadas de campo, encontra-se atualmente no Museu Real Tyrrell, no Canadá. Através de sofisticados scans 3D, os cientistas puderam reconstruir o delicado sistema auditivo e compará-lo com o de espécies vivas.

A descoberta não só reescreve a história evolutiva dos peixes de água doce, como também ilustra de forma fascinante como a adaptação ao som foi uma chave para o sucesso de milhares de espécies que hoje habitam rios e lagos em todo o mundo.

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