“Superalimento”criado por cientistas aumenta reprodução de abelhas e pode ajudar a travar o seu declínio
Caroline Name.
Investigação da Universidade de Oxford demonstra como a biotecnologia pode oferecer uma solução acessível e sustentável para proteger as abelhas, fundamentais para a produção de alimentos.
Um novo suplemento alimentar desenvolvido por cientistas da Universidade de Oxford, em colaboração com os Jardins Botânicos Reais de Kew, a Universidade de Greenwich e a Universidade Técnica da Dinamarca, demonstrou melhorar significativamente a reprodução de colónias de abelhas. Os resultados foram publicados hoje, 20 de agosto, na revista Nature.
Criação de abelhas em gaiolas de laboratório, Oxford Bee Lab. Crédito: Caroline Wood.
O problema: défice nutricional crítico
As abelhas dependem de uma dieta variada de pólen para obter os nutrientes essenciais ao seu desenvolvimento, incluindo lípidos específicos chamados esterois. Contudo, as alterações climáticas e a intensificação agrícola têm reduzido drasticamente a diversidade floral disponível. Como resultado, muitos apicultores recorrem a substitutos artificiais de pólen — misturas à base de farinhas proteicas, açúcares e óleos — que, infelizmente, carecem dos esterois certos, tornando-se nutricionalmente incompletos.
A inovação: suplemento enriquecido com esterois essenciais
A equipa de investigação conseguiu modificar geneticamente a levedura Yarrowia lipolytica para produzir uma mistura precisa de seis esterois essenciais à saúde das abelhas. O suplemento foi testado em colónias durante ensaios de alimentação de três meses, realizados em estufas fechadas para garantir que as abelhas consumiam apenas a dieta experimental.
Resultados-chave:
As colónias alimentadas com o suplemento enriqueceram até 15 vezes mais larvas até à fase de pupa viável do que aquelas com dietas convencionais.
Continuaram a criar cria até ao fim do período de estudo, ao passo que as colónias com dietas deficientes deixaram de produzir cria ao fim de 90 dias.
Os esterois presentes nas larvas alimentadas com o suplemento correspondiam aos encontrados em colónias com alimentação natural, sugerindo uma seleção biológica pelos nutrientes mais importantes.
Produção sustentável com biotecnologia
Usando a tecnologia CRISPR-Cas9, os cientistas editaram o genoma da levedura Yarrowia lipolytica, uma espécie já usada na alimentação em aquacultura, por ser segura, rica em lípidos e fácil de escalar industrialmente. O suplemento final foi produzido em biorreatores, colhido e transformado em pó.
“A nossa investigação mostra como a biologia sintética pode resolver desafios ecológicos reais,” afirmou a Professora Geraldine Wright, da Universidade de Oxford. “Criar um suplemento completo com esterois naturais seria logisticamente impossível — esta solução é acessível, segura e eficaz.”
Uma das colmeias do Oxford Bee Lab. Crédito: Caroline Wood.
Potencial impacto na agricultura e biodiversidade
As abelhas são polinizadoras fundamentais para mais de 70% das principais culturas agrícolas a nível mundial. O seu declínio — causado por défices nutricionais, doenças, pragas, pesticidas e alterações climáticas — representa uma séria ameaça à segurança alimentar e à biodiversidade.
Além disso, ao reduzir a dependência de fontes naturais de pólen, este suplemento também pode aliviar a pressão sobre as flores silvestres, beneficiando outras espécies de polinizadores.
“Este suplemento pode representar uma verdadeira mudança de paradigma, especialmente em ambientes onde há escassez de recursos naturais para as abelhas,” comentou Danielle Downey, da organização sem fins lucrativos Project Apis m.
Foto: Crédito: Caroline Wood.
Próximos passos
Embora os resultados iniciais sejam promissores, os investigadores alertam para a necessidade de ensaios em campo de maior escala para avaliar os efeitos a longo prazo na saúde das colónias e na eficácia da polinização. Se tudo correr como esperado, o suplemento poderá estar disponível para apicultores e agricultores dentro de dois anos.
Além disso, esta tecnologia pode vir a ser adaptada para desenvolver suplementos nutricionais para outros polinizadores ou insetos criados para fins agrícolas.